O embate entre o real e o imaginário na literatura

O embate entre o real e o imaginário na literatura

Publicado: 31/08/2019 10:49:09
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A literatura de ficção e seu embate entre o real e o imaginário estiveram presentes na noite de sexta da 7ª Feira do Livro de São Francisco do Sul. O escritor catarinense Godofredo de Oliveira Neto, autor de diversos romances e ensaios e professor titular de Literatura da Universidade Federal do Rio de Janeiro, disse também que só há um caminho ao estímulo da leitura nas escolas, e ele passa pelo retorno do estudo da Literatura Brasileira nas aulas de Língua Portuguesa.

“Mas não por aquela coisa chata, de decoreba de que escritor fulano nasceu em tal ano e morreu em tal ano e fez tais obras. Mas no aprofundamento de temas que estão hoje em discussão, questões de gênero e sexualidade, como nas obras de Adolfo Caminha (O Bom Crioulo, 1895) e Aluísio Azevedo (O Cortiço, 1890). Machado de Assis escreveu o maior tratado sobre o ciúme que se conhece em Dom Casmurro (1899), e mesmo no (Memórias Póstumas de) Brás Cubas, no sétimo capítulo, tem uma cena em que o personagem delira à beira da morte e se imagina cavalgando um hipopótamo até a origem dos séculos. No final, depois de ver toda a trajetória da humanidade, seu egoísmo, sua busca incerta e vã pela felicidade, ele percebe que o hipopótamo é o próprio gato. Mas nessa passagem há toda uma intertextualidade que pode muito bem ser trabalhada nas escolas de modo a falar de temas que são muito atuais”, disse.

Nascido em Blumenau, em 1951, Godofredo de Oliveira Neto precisou se exilar na França no começo dos anos 1970, embora não tivesse uma atividade política, e lá se formou em Letras e Altos Estudos Internacionais pela Sorbonne. Membro das academias Carioca e Catarinense de Letras, presidiu a Comissão de Língua Portuguesa do Ministério da Educação e o Conselho Científico do Instituto Internacional de Língua Portuguesa da CPLP, entidades responsáveis pela implementação do novo acordo ortográfico nos países lusófonos. Entre 2002 e 2005, dirigiu o departamento de Ensino Superior do MEC.

Seu livro O Bruxo do Contestado (1996) foi indicado como revelação do ano pela Folha de São Paulo e revista Veja, e Amores Exilados (2011) foi aclamado pela crítica como um dos melhores romances sobre os exilados políticos pela ditadura militar. Oleg e os Clones (1999), Marcelino (2008), A Ficcionista (2013) e o mais recente, Grito (2016), também foram bastante destacados pela crítica especializada. Mas foi justamente o livro em parte escrito em São Francisco do Sul, Menino Oculto (2005), que mais lhe trouxe notoriedade. São duas edições no Brasil e uma quarta saindo em setembro na França, onde foi traduzido.

Premiado com o segundo lugar no Jabuti de 2006, a mais importante premiação da Literatura Brasileira, Menino Oculto é um livro que se desdobra, barrocamente, em várias narrativas: a policial, a histórica, a folclórica e psicológica, falando de arte, de música, de cultura pop, de violência, de loucura. Na obra aparecem vários mitos da Baía da Babitonga, relatos que, segundo Godofredo, se amalgamam com outros do folclore brasileiro, como o do gavião dos infernos, o sete-cuias, a rainha das águas, o rasga-mortalha, bruxas e lobisomens.

Entre os personagens que atravessam a alucinada história do falsificador de quadros Aimoré Seixas, que a todo instante reproduz a pintura Menino Morto (1944), de Cândido Portinari, e vai em busca da mulher sua vida, Ana Perena, estão o cego Baltazar, curandeiro que vive num rochedo na Vila da Glória, o também pintor falsário Aristides, os barqueiros gêmeos da Babitonga, Alceste e Querência, representações do céu e do inferno, e, como não podia deixar de ser, Içá-Mirim e Goneville.

O autor doou exemplares do livro para a Biblioteca Pública Municipal Augusto José Ribeiro e para a biblioteca da Escola Santa Catarina. A conversa com o autor ontem (30) à noite, no Cine Teatro X de Novembro, foi intermediado pela professora e historiadora Andréa de Oliveira. Antes do bate papo com o escritor, foi realizada uma apresentação do grupo de dança Maritmos.

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